Todo ano, mais ou menos em julho-agosto, volta à tona alguma grande questão que pode impactar no reconhecimento da cidadania de descendentes de italianos.
Na última semana se falou muito sobre a Grande Naturalização. Mas, você sabe o que é isso?
A grande naturalização foi um decreto do Governo Provisório da República do Brasil, de 1889, que tornava cidadão brasileiro todo estrangeiro residente no Brasil naquele momento.
Se o estrangeiro em questão não quisesse se tornar brasileiro e tivesse a intenção de manter a nacionalidade de origem ele deveria manifestar sua vontade em um cartório, no prazo máximo de 6 meses após a publicação desse decreto.
Por outro lado, a Itália começou a reconhecer a dupla cidadania somente em 1912. Antes disso, para a Itália, se um cidadão adotava a nacionalidade de outro país ele deixava de ser legalmente cidadão italiano.
E, o que fundamenta a “Grande Naturalização”, é a teoria de que os cidadãos italianos que residiam no Brasil em 1889 foram automaticamente naturalizados brasileiros.
E, qual o motivo para isso tudo ser uma grande loucura?
Bom, primeiramente essa tese vai contra os princípios e as leis, tanto brasileiras quanto italianas. O Código Civil Italiano, em seu artigo 11, prevê que a renuncia à nacionalidade italiana deverá ser declarada declarada.
Na prática, a tese da Grande Naturalização age como se a lei brasileira sobrepusesse a lei italiana. Acontece que são raríssimos os casos onde o italiano tomou ciência desse decreto e mais raros ainda os italianos que expressaram voluntariamente a vontade de se tornarem brasileiros.
Embora a tese tenha sido aprovada em dois casos, centenas de outros processos enfrentaram a mesma argumentação da Avvocatura e as sentenças posteriores continuam afastando a aplicação da mesma, demonstrando que a Tese da Grande Naturalização não possui qualquer embasamento jurídico.
Ok, mas se já foi entendido que essa tese não tem fundamento, por que a Avvocatura dello Stato recorre?
O grande motivo é o aumento expressivo de pedidos de reconhecimento de cidadania contra as filas, já que durante a pandemia os consulados fecharam, impossibilitando o reconhecimento dos que já estavam agendados e deixando de fazer novos agendamentos.
Além dessa, também existe uma motivação política que tem como intenção intenção inserir outras modalidades de atribuição de cidadania, como o jus solis e o jus culturae, que estão sendo discutidos.
E agora, o que mudou?
Até o presente momento, nada mudou.
O importante é que você saiba que no último dia 12/julho duas ações chegaram ao grau máximo de recurso na jurisdição italiana.
O debate aconteceu em audiência pública entre os advogados desses processos, o Ministério Público e o Ministero Dell’Interno representado pela Avvocatura dello Stato.
Os advogados dos descendentes apresentaram a sua tese com convicção e muito preparo técnico. O Ministério Publico, por sua vez, apresentou seu parecer no mesmo sentido. Ou seja, a Procuratoria Generale mostrou todos os aspectos históricos e defendeu que a renúncia automática é inaplicável, mantendo-se no mesmo entendimento da sentença de 1907 emitido pela Corte di Napoli.
O parecer do Ministério Público é importantíssimo pois atua como defensor dos direitos difusos e coletivos. O parecer favorável à causa dos ítalo descendentes foi uma grande e esperada vitória.
Já a Avvocatura dello Stato, que defente a Grande Naturalização, baseou sua defesa em teses muito mais de caráter político que jurídico e não parece ter convencido os magistrados.
Agora os juízes reunidos irão avaliar os argumentos e o relator irá proferir o Acórdão. Em função das férias forenses, é possível que a publicação aconteça apenas em setembro.
Este julgamento não tem efeito vinculante, ou seja, não atinge outros processos mas ajudará consolidar o direito indiscutível dos descendentes de italianos.
Fonte: Claudia Scarpim, Nacionalitália