O Decreto da Cidadania Italiana (Decreto-Lei nº 36, de 28 de março de 2025) dominou os debates da 1ª Comissão Permanente do Senado nesta terça-feira, 15 de abril. O texto, que altera as regras para o reconhecimento da cidadania por descendência, gerou forte reação de senadores da oposição e da base aliada.
Durante a sessão, diversos parlamentares expressaram preocupação com os impactos práticos e simbólicos do decreto, especialmente sobre milhões de ítalo-descendentes residentes na América do Sul.
Segundo reportagem do Italianismo, a resistência ao texto foi ampla e embasada por diferentes argumentos políticos, culturais e jurídicos.
Importante: Este conteúdo é um recorte dos principais posicionamentos apresentados no debate e não representa a totalidade das opiniões manifestadas na sessão da Comissão. Vários outros senadores também participaram da discussão, e novas manifestações devem ocorrer nas próximas sessões.
@dallitaliacidadania Comentando os reflexos do decreto-lei 36 no Senado Italiano. #cidadaniaitaliana #italia
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Críticas à urgência e à exclusão de descendentes legítimos
A senadora Francesca La Marca (Partito Democratico) foi uma das vozes mais críticas. Para ela, a adoção do decreto por meio de urgência foi um grave equívoco:
“É um erro recorrer a um decreto de urgência. Não há justificativa. O texto foi elaborado sem diálogo com parlamentares eleitos no exterior ou com o CGIE (Conselho Geral dos Italianos no Exterior)”.
La Marca também denunciou o colapso nos serviços consulares após a publicação do decreto:
“Criou-se uma situação caótica. Foram bloqueados os agendamentos para cidadania, inclusive de quem tem direito legítimo”.
Como alternativa, ela sugeriu critérios mais justos e objetivos, inspirados em modelos internacionais:
“Seria melhor adotar uma prova de língua, cultura e educação cívica, como fazem Canadá e Estados Unidos”.
Defesa do decreto: controle e contenção de abusos
O senador Roberto Menia (Fratelli d’Italia) saiu em defesa do decreto, justificando sua adoção como medida de contenção:
“Recebemos dezenas de milhares de solicitações baseadas em uma descendência de seis gerações, muitas vezes sem qualquer vínculo com a Itália”.
Ele também ressaltou o lado econômico do processo de reconhecimento:
“Cada pedido custa cerca de 5 mil euros. É um negócio que movimenta milhões”, declarou, referindo-se a intermediários e estruturas paralelas.
Mesmo assim, Menia reconheceu que ajustes podem ser necessários:
“A norma pode ser rigorosa demais. Por isso, proponho um teste de italiano nível B1, facilitação para quem quiser retornar à Itália e comprovação periódica do vínculo com o País”.
Retroatividade e perda automática da cidadania
Um dos pontos mais polêmicos do decreto é a retroatividade da perda de cidadania. O texto determina que quem nasceu fora da Itália e possui outra nacionalidade será considerado como nunca tendo adquirido a cidadania italiana — regra que já impede novos pedidos desde 27 de março de 2025.
Vozes de oposição ao formato e conteúdo do decreto
Para o senador Antonio Nicita (Partito Democratico), a forma escolhida para tratar a matéria é inaceitável:
“É anômalo tratar um direito constitucional com urgência. O foco deveria ser o futuro da população, que envelhece e vê seus jovens emigrando”.
Já o senador Andrea Tosato (Lega) apontou o risco de se perder o elo com as comunidades no exterior:
“É preciso conter abusos, sim. Mas também proteger o sentimento de italianidade nas comunidades do exterior”.
“Essas pessoas são embaixadoras da Itália no mundo. Se não houver equilíbrio, vamos perder o vínculo que elas mantêm com o nosso país”.
Propostas para revisão e suspensão dos efeitos imediatos
O senador Alessandro Cataldi (Movimento 5 Stelle) criticou o uso do argumento de urgência, classificando-o como frágil:
“Não se pode tratar um tema que afeta 80 milhões de ítalo-descendentes por causa de queixas de um ou dois municípios do Vêneto”.
Ele propôs uma “pausa técnica” para que os critérios sejam reavaliados e os efeitos da retroatividade, melhor analisados:
“Podemos suspender temporariamente as análises para revisar os critérios, apoiar os municípios e avaliar melhor o impacto da retroatividade”.
Exclusão como política: críticas à estratégia governamental
A senadora Dafne Musolino (Italia Viva) também atacou frontalmente o decreto:
“O decreto transforma o reconhecimento da cidadania em uma negação de direitos. Quem não pediu até 27 de março perde a chance para sempre”.
Musolino apontou alternativas mais construtivas:
“Poderíamos ter digitalizado processos ou ampliado os guichês consulares. Optar pela exclusão, sobretudo com retroatividade, é inaceitável”.
Ela também destacou o papel financeiro dos italianos no exterior:
“Só da Sicília, 300 milhões de euros são enviados por italianos no exterior às suas famílias. Vamos negar cidadania a quem sustenta regiões inteiras?”.
Governo sinaliza abertura ao diálogo
A subsecretária Maria Tripodi (Forza Italia) reconheceu a relevância das críticas e afirmou que o governo está disposto a ouvir:
“Agradecemos os valiosos elementos de reflexão”, disse, durante a audiência, sinalizando abertura para discutir ajustes no texto.
O debate continuaria na sessão de quarta-feira, 16 de abril, e o governo indicou que estaria aberto a emendas até às 17h do mesmo dia.
Proposta de emenda da Lega busca aliviar impacto
De acordo com apuração do Italianismo, a Lega, partido da base governista, já protocolou uma emenda ao texto original. A medida visa preservar, ao menos em parte, os direitos dos descendentes de italianos nascidos fora da Itália.
Ainda não houve divulgação oficial do conteúdo da proposta, mas ela é vista como um sinal positivo de negociação, dentro da base aliada, para atenuar os efeitos mais rígidos do decreto.
Conclusão
O Decreto da Cidadania Italiana provocou forte repercussão no Senado. Embora o governo o defenda como necessário para controlar abusos, muitos parlamentares alertam para efeitos desproporcionais sobre milhões de ítalo-descendentes legítimos.O debate político está em curso, e a possibilidade de mudanças reais depende da capacidade de diálogo entre governo e oposição. A esperança dos descendentes, agora, está nas emendas e ajustes em nome do equilíbrio entre controle e pertencimento cultural.